Ana Faria é economista do ambiente e, nos últimos tempos, tem estado interessada em questões relacionadas com a Cooperação e a relação das comunidades nos países em desenvolvimento com os recursos naturais. Nesse sentido, a Ana Juntou-se à Solsef, para, nos próximos tempos, escrever esta rúbrica que agora estás prestes a ler: "Às quartas refletimos". Nela irá falar, durante as próximas semanas, sobre este e outros temas. Continua a ler!
Embora não seja certo exatamente quando começamos a produzir música, instrumentos musicais reconhecíveis encontrados por arqueólogos ajudam a perceber que a música assumiu o seu papel junto dos seres humanos há milhares de anos. Em 2009, foi descoberto o instrumento musical mais antigo do mundo, numa gruta na Alemanha: uma flauta em osso de grifo com quase 40.000 anos. Mas antes disto a produção de som através de assobios e batimentos corporais já estaria presente, como forma indissociável da própria comunicação.
Pelo menos deste então, a produção musical tem estado presente de variadas formas e por vários motivos, desde cerimónias religiosas e tradicionais, a formas de entretenimento e conforto emocional. Tradicionalmente, também tomaram o seu lugar na transmissão de histórias de geração em geração, bem como na satírica e relações amorosas – na tradição musical portuguesa destacam-se, tratando estas temáticas, as tão conhecidas cantigas trovadorescas de amor, de amigo, e de escárnio e maldizer (se a curiosidade chama, investigadores da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade NOVA de Lisboa reuniram estas cantigas com versões musicais, podendo ser ouvidas aqui). Assume também um papel central na cultura e tradições dos povos, desde logo em celebrações religiosas, rituais de iniciação e celebrações fúnebres, também associada à dança. Em Moçambique, por exemplo, a dança Mapiku persiste no seio da tradição Makonde.
A música acompanha também a sociedade, não só a par das tendências, mas assumindo-se igualmente como um comunicador de críticas sociais e políticas. Mas para além de retratar as imperfeições, também transmite mensagens apaziguadoras em tempos difíceis como é exemplo a música Andrà Tutto Bene (Vai Ficar Tudo Bem), lançada em 2020 e associada à pandemia COVID-19.
Para além de proporcionar momentos de entretenimento e até de nos aproximar de outras pessoas, a música tem ainda efeitos sobre o nosso humor, oferece-nos uma fonte de distração e para passar o tempo, diminui stress e ansiedade, e faz-nos recordar momentos e pessoas. Ainda assim, o controlo e a gestão de emoções parecem ser as razões principais pela quais ouvimos música, sendo uma forma de suavizar sentimentos negativos e de nos fazer sentir melhor, e uma forma mais completa e eficaz de atingir esses objetivos do que outras atividades recreativas.
Grupo de jovens a fazer música em fevereiro de 2020, em Contuboel (Guiné-Bissau)
Também a nível da saúde se verificam efeitos positivos na regulação da dor, no nível de cortisol no sangue (associado ao stress) no pós-cirurgia, bem como na melhoria das funções imunitárias através da transmissão de emoções positivas. Pode ainda ajudar a diminuir o declínio cognitivo em pacientes com Alzheimer, bem como contribuir para prevenir doenças como Parkinson através da libertação de dopamina. De forma relacionada, consegue ainda auxiliar na realização de exercício físico, ao transmitir motivação e diminuindo a perceção do esforço e cansaço. Também a memória e o desempenho cognitivo parecem sair beneficiados quando ouvimos música. Muitos destes benefícios são ainda potenciados pela musicoterapia, uma prática que visa precisamente promover e alcançar necessidades físicas, cognitivas e emocionais, entre outras, através da experiência musical.
A música destaca-se também enquanto um ótimo instrumento de suporte para a educação multicultural, permitindo aos alunos desenvolver entendimento, curiosidade e abertura cultural. De uma forma geral, a música pode incentivar os alunos a identificar e compreender as diferenças entre as diversas culturas, bem como a apreciar e aceitar essas diferenças.